A triste história do odontólogo que passou a mutilar pacientes…

Silvio Carlos Beltrami, de Capão da Canoa, sedava pacientes e causava danos aos dentes com o objetivo de lucrar com implantes dentários…

Aos pacientes, o cirurgião-dentista Silvio Carlos Beltrami Gonçalves garantia:

– Sou designer de dentes e vou de te deixar com sorriso de artista de TV.

Por quase duas décadas, ele honrou a palavra, tornando-se um badalado dentista de Capão da Canoa.  O carro-chefe eram os implantes, média de 60 por mês, número considerado altíssimo para os padrões da cidade. O dentista era auxiliado pela mulher, uma estudante de Odontologia seis anos mais jovem, que se formaria em 2013 e com a qual Beltrami viveu durante quase uma década. No Natal de 2010, ela foi à polícia dizer que estava saindo de casa, “por desentendimentos entre o casal”. Nessa época, começaria a derrocada profissional de Beltrami.

A clínica amanhecia apinhada de pacientes do Litoral Norte, de Porto Alegre, de Santa Catarina. Para dar conta, Beltrami atendia de segunda a segunda das 7h até altas horas da noite. Segundo relatos de amigos e pacientes, suportaria o cansaço à base de analgésicos de uso restrito em ambiente hospitalar.  A família chegou a interná-lo para tratamento desintoxicante. Como dentista, Beltrami tinha acesso livre a medicamentos especiais.

2012, a Vigilância Sanitária de Capão da Canoa suspendeu o fornecimento de talonários para prescrição de morfina e dolantina – utilizados para aliviar dor intensa, inclusive de doentes terminais. O dentista Silvio Carlos Beltrami vinha tentando obter mais receitas, mas, por suspeita de uso indevido, constatado por reclamações de drogarias, foi exigido que o dentista justificasse a necessidade. O consumo de remédios controlados teria transtornado Beltrami. Para uma paciente que reclamava de dor, teria oferecido morfina.
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Assim, a promessa de sorriso perfeito logo se transformaria em choro, dor e sofrimento para os pacientes – com dentes estragados, dificuldade para mastigar, cuspindo e babando ao falar – além de prejuízos financeiros. Beltrami teria causado lesões em 51 pacientes. Teve registro profissional cassado por causa de 16 queixas ao Conselho Regional de Odontologia (CRO). Uma das reclamações dos pacientes era de que cobrava por serviços não combinados.

O dentista também atemorizava os pacientes com diagnósticos assustadores, para cobrar por tratamentos desnecessários, como lembra um oficial da Brigada Militar aposentado.
– Depois de fazer um Raio-X, falou que minha mulher tinha uma bactéria que causaria a perda da visão. Cortou um pedaço da gengiva e cobrou R$ 14 mil. Um estelionato.

A mais grave das acusações contra o dentista: ao invés de embelezar os dentes, Beltrami os estragava. Para isso, colocava os pacientes para dormir, ainda na sala de espera. Conforme consta em processo ético do CRO, aplicaria injeções intravenosas, sem acompanhamento de anestesista, fazendo os pacientes adormecerem por longas horas na clínica e colocando-os em risco de morte. O apagão na cadeira do dentista permitia que ele extraísse ou estragasse dentes saudáveis. Depois, diante do desespero de pacientes banguelas, Beltrami se desculpava, alegando que era a única alternativa para evitar doenças.

– Só eu posso salvar teus dentes – garantiu a uma paciente.

Há relatos de que Beltrami costumava trabalhar com uma pistola sobre a mesa do consultório, levando pacientes a se sentirem sob ameaça. Em audiência no CRO, alegou que era colecionador, tinha armas por questões decorativas e guardava armas em outro ambiente da clínica, longe do alcance dos pacientes. Uma noite, nervoso, ao ouvir um barulho na recepção, o dentista teria pedido ao acompanhante de uma paciente para pegar um revólver para uma eventual reação a ladrões, pois acreditava que estavam invadindo a clínica. Na verdade, tratava-se de um empregado fechando a porta da frente da clínica.16934805

Das 51 queixas de pacientes contra o cirurgião-dentista Silvio Carlos Beltrami Gonçalves, registradas na Polícia Civil de Capão da Canoa, em 26 foram concluídas as investigações e remetidos os inquéritos para a Justiça. As demais seguem em apuração. Dos 26 inquéritos, sete já viraram processos criminais, com acusação de lesões corporais. Outros 13 foram arquivados por falta de provas. O Conselho Regional de Odontologia (CRO) recebeu 24 denúncias contra Beltrami, 16 se confirmaram. A entidade reconheceu graves erros, condenando-o com a cassação do registro profissional nos 16 processos éticos, decisão ratificada em primeiro grau pelo Conselho Federal de Odontologia na primeira instância, ainda cabendo recurso.

Quando foi suspenso temporariamente pela Justiça Federal, a pedido do CRO, em abril de 2013, Beltrami alegou que era vítima de um complô para prejudicá-lo, arquitetado por uma ex-namorada, versão não comprovada.
Em parte dos processos Beltrami não foi encontrado pela Justiça. Estaria em Balneário Camboriú ou em Buenos Aires, cursando Medicina, segundo relato de ex-pacientes.
O dentista Silvio Beltrami não foi localizado. O jornal Zero Hora procurou os advogados dele, Roberto Ludwig e Lorenzo Alberto Paulo. Ludwig, que atua nos processos cíveis, informou que não faria declarações.

FONTE: HZ

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